terça-feira, 30 de junho de 2015

Correnteza

Nunca foi a minha intenção
Molhar minhas roupas e cabelo
Perder o norte
Perder o rumo
Perder você

Cheguei com muito cuidado
Para molhar os pés
Era quente o dia
Me sentia derreter
Nada mais justo
Nada mais puro
Nada mais burro

Escorreguei na pedra
A correnteza me agarrou
Mais rápido
Mais forte
Mais tontura
Mais medo

E o mundo girou
A respiração foi presa
Em reflexo de tentativa
De sobreviver
À cascata
Às pedras
À velocidade
Ao caos

E lá embaixo
A parede fria
Acima da minha cabeça
Crescendo rapidamente
O muro incalculável
Que me pesa por cima
A escuridão chegando por baixo
A entrega ao inevitável
A desistência
A desesperança
O fim

Procuro por oxigênio
Na sua boca
Onde está sua mão
Que não me massageia o peito
Cadê você
Que tanta promessa
Tinha nos olhos
Traga-me de volta à vida
Salva-me, doutor

quarta-feira, 24 de junho de 2015

Retorno

Pode olhar de novo
Sim, claro
Pode perguntar
Você me diverte
E eu lhe quero bem

Não, nada mudou
A conversa flui
A risada também
Ainda sou a mesma
Bem como você

Continuamos diferentes
Principalmente nas escolhas
Você me rotula "racional"
Eu me considero "precavida"

Você é bem vindo
Me mostrou uma saudade
E um amor cheio de carinho
Que eu não lembrava sentir

Mas não se esqueça
Existe só uma versão de mim
Que colocou você
Em seu devido lugar
Há muito, muito tempo atrás



sábado, 20 de junho de 2015

Saudade

Nesse silêncio
Triste
Ecoam
Todas as frases em
Que lamentávamos
Os desencontros

Ouço a sua voz
E a minha
Alternarem-se
Mas só eu choro

Nesse silêncio
Absoluto
Estalam
Todos os beijos
Que não foram dados

Esfriam os abraços
Roubados
E a promessa
Concretiza-se

Nesse silêncio
Definitivo
Escoa o meu amor
Sugado pelo
Imenso nada
Que fomos nós

sexta-feira, 19 de junho de 2015

Mau Humor

Abraço a minha raiva
Com a mesma sinceridade
Que abraço os meus amores

Não estou a arquitetar
Os merecidos
Planos de vingança
E nem vou desejar
A morte de ninguém
Minha amargura
Não chega a tanto

Mas estou longe
De ser canonizada
E o golpe foi
Baixo demais
Doído demais
Sórdido demais

E à turma do
"Deixa disso"
E a do
"Perdoar é divino"
Um aviso:
Calem a boca
Senão serão
Odiadas também

Tudo tem seu tempo
Passa noutro dia
Ou noutra vida

quarta-feira, 17 de junho de 2015

Roda da Fortuna

Em algum lugar por aí
Uma borboleta sai do casulo
E uma mulher veste preto
Para ir ao velório do filho.

Uma nova vida é criada
E alguém entra num centro cirúrgico,
É colocado para dormir
Rezando para acordar.

Um peixe pula sobre as águas
A tempo de escapar da boca do urso
E um feto escorrega pela fenda
Do colo do útero, numa fisgada de dor.

Duas pessoas trocam olhares
E se apaixonam
E um pai ensina matemática para o filho,
Descobrindo que o jeito de se dividir,
Hoje em dia, é diferente.

Um leão estraçalha uma gazela.
Pais contam aos filhos
Que decidiram pelo divórcio.
Contratos dos sonhos são assinados.

Músicas tocam,
Artistas dançam e compõem.
Rios correm,
Flores se abrem,
Crianças sorriem.

E eu aqui, olhando pela janela
Penso em você, tristemente,
Como se nada mais no mundo existisse...
Eu te amo.


terça-feira, 16 de junho de 2015

Plano

Não vou mais prometer
Prá mim mesma
Que é a última vez
Que eu penso em você

Que é o último poema
A última carta
A última declaração
A última lágrima

Vou deixar acontecer
Como acontece de o rio passar
De a estação mudar
De o dia escorrer entre os dedos

Eu não calculei o começo
Errei a mão no durante
E não previ o fim
Que pressa tenho agora?

Não vou mais fingir
Que tenho controle sobre isso
Que me conheço tão bem
Que prevejo meus próximos passos

Quero que a última vez
Passe despercebida
Não deixe marca
Nem saudade

domingo, 14 de junho de 2015

Abrindo o Jogo

Eu me declarei chorando
Explodindo de tristeza
Não sabia a quem recorrer
Ou quem podia me ajudar
A não ser ele mesmo
Que não entendeu nada
Foi pego de surpresa
Tanto quanto eu fui
Pela intensidade
Do meu sentimento

"Me ajuda" - eu pedia
"Me salva de mim mesma"
Ele segurou as minhas mãos
Enxugou as minhas lágrimas
Beijou o meu rosto
E me prometeu
"Nunca, nada... não chora...
Eu garanto..."
E cumpriu.
Por dois meses.
Do resto, a vida
Se encarregou...







sábado, 13 de junho de 2015

Clichés

Quando a pessoa
Se vai
Antes do sentimento
Ter expirado

Quando ela
Escolhe outro rumo
Antes que você
Mude de direção

Quando alguém
Desama antes
Que você tenha
Tentado tudo

Quando o amor desanda
Antes que a esperança
Tenha morrido
De fato

A existência dessa pessoa
Grita dentro de você
A inércia se impõe
O sofrimento o assola

E tudo lembra ela
O seu cabelo crescendo
A brancura da sua mão
E o formato da sua boca

E absolutamente
Tudo o que fez parte de "vocês"
Dói feito ferida aberta
Em carne viva

Nesse quarteirão
No próximo
E no próximo
Ela o espera
Em saudade palpável

Porque aqui
Está aquele restaurante
E ali o lugar
Em que você estacionou
Prá atender o telefone
E ali é a curva
Que vai levar à casa dela

E nada resta a fazer
A não ser esperar
Que o tempo
Faça a sua mágica

E que o coração
Se aquiete
Torcendo prá memória
Começar a falhar

Porque certo
Como um grande amor
Pode acabar
Um novo dia
Está prá começar

"Nada é para sempre"
"Ninguém nasceu prá sofrer"




quinta-feira, 11 de junho de 2015

Dúvida

Deus
Se o Senhor existe mesmo
Teremos uma longa conversa
Quando nos encontrarmos

Primeiro perguntarei
Quem o Senhor é de verdade
Se o amoroso de uns
Ou o implacável de outros

Aí decidirei
Se posso (ousar) perguntar
Tudo o que está entalado
Na minha garganta há tantos anos

Por exemplo
Qual o sentido
De colocar curiosidade
Sem capacidade de entendimento
Num mesmo ser

Instinto animal
E vontade de socializar
Esperança de influenciar os outros
E necessidade de respeito às escolhas

Sonhos a respeito de vida após a morte
E dúvidas infinitas sobre isso
Mas, principalmente: na tal da Criação...
O que é que o Senhor lucrou com isso?





terça-feira, 9 de junho de 2015

Doutores

Ele me encontrava no meio do hospital, e na frente de todo mundo me chamava de "doutora".
As pessoas se entreolhavam, meio sem entender, meio pressentindo a nuvem cinza sobre nossas cabeças.
No começo, eu o puxava de lado e murmurava entre os dentes: "deixa disso, somos colegas".
Dali a cinco minutos ele estaria falando em sílabas: "dou-to-ra!"
Até que eu desisti de reclamar e o tal "ser chamada de doutora" virou termômetro do humor dele comigo.
Nos momentos em que eu estava muito brava, devolvia um "doutor cirurgião", e ele me fuzilava com os olhos.
Mas quando estava tudo bem, quando estávamos sozinhos e ele baixava a guarda, os meus títulos eram bem diferentes.
E ambos ficávamos felizes de termos muita saúde, naquela hora.
Porque se um dos dois precisasse de assistência médica, com certeza, o outro não conseguiria dar...

Vazio Feliz

Nada quero.
Porque já tenho o suficiente.
E o que não tenho e quero
É a impossibilidade
Das impossibilidades...

Então nada mais me resta
A não ser
Ser feliz do jeito que está
E amanhã tudo muda...
Amanhã tudo mudará!

segunda-feira, 8 de junho de 2015

Expectativa

O mundo tem cantos
Encantos
Recantos
Praias
Montanhas
E pradarias
Que aguardam
Os meus olhos a
Serem testemunhas
Das suas belezas

A vida tem pessoas
Cujas vidas
Caminham para
O toque da minha
São potenciais amigos
Vizinhos
Amantes
Pacientes
Alunos
Parentes
E agregados
Bem vindos ou não
Vêm ao meu encontro
Todo santo dia

Músicas serão criadas
Artes esculpidas
Poesias concatenadas
Pinturas ganharão cores
Cenas e histórias
Conversas e encontros
Risadas e emoções
Perfumes diferentes
E gostos a serem testados

Existe um naco
De felicidade
Que é meu por direito
Que às vezes me chega
Em conta-gotas
E às vezes invade
Feito enchurrada
Que me prova que
Estou viva e
Que me lembra o
Quanto eu amo isso tudo
(E eu vim tomar posse, mesmo)

domingo, 7 de junho de 2015

Desabafo

Não foi
O homem mais bonito
A melhor pessoa ou
O sorriso mais doce
Que eu conheci

Não foi
Uma linda história
Um beijo quente
Uma saudade sofrida ou
Um rótulo qualquer adequado

Mas foi
O maior vendaval
A puxada de tapete
O tirar do meu chão
A surpresa
O enigma
O esclarecimento
A confusão

Emoções conflitantes
Decisões se alternavam
Sede e repulsa
Vontade e medo

O depositário
Dos meus segredos
Porque o maior deles
Era ele mesmo

Uma sucessão
De silêncios
E muita coisa dita
Em frases poucas
E definitivas

E na minha cabeça
Ecoa a sua voz
Prá sempre
No meu sentimento
De perda de nada
E de tudo
Ele me diz
"Que pena..."


sábado, 6 de junho de 2015

Pais e Filhos

O sexo é
Vital
Enquanto
Para se criar
Uma vida
Duas outras
Tiverem
Que se fundir
Mesmo que
Num único ato
Tão longe
De amar

O amor é
Necessário
Enquanto
Nascerem
Bebês
Frágeis
Seres
Dependentes
Da existência
Dos outros

O amor é
Fundamental
Enquanto
Como seres
Humanos
Nossos
Defeitos
Precisem
Ser tolerados

O amor é
Insubstituível
Porque
Existe
Tanta gente
Incapaz de amar
Gerando filhos
Por aí


quinta-feira, 4 de junho de 2015

Lua Cheia

Eu hoje queria ser uma loba selvagem
Subir o morro mais alto e gritar para a lua com todo o ar dos meus pulmões

Vomitar a minha dor até fica rouca porque
Chorar não me basta
Chorar não me basta
Chorar não me...

Eu segui as regras e arranquei a minha pele
Me entreguei com frio e em carne viva
Em confiança ao dono

Recebi o prometido
Mas antes um banho de salmoura
Para que a felicidade saísse a mais cara possível
Sobrevivi, mas nunca mais a mesma

Queria dar esse grito aliviador
Prova de vida
Expurgo de dor

Por que a lição a se aprender tem que ser dura?
Por que não se aprende também através de amor?

E agora
Que a garganta se fecha
E estou num apartamento
Eu não sou loba
Agora é o momento certo para o silêncio
Shhh...
(Escuta as lágrimas)...





terça-feira, 2 de junho de 2015

Viajante

Seu coração
Procurava
Um porto
Seguro
De paz

Seus olhos
Ansiavam
Pela terra
Firme
E a segurança
Do amor

Mas a boca
Só conhecia
O gosto
Das lonjuras
E da sede
Do descobrimento

Mulherão número 5

Eu não me importava
Em segui-la
Por onde quer que fosse
Como faziam seus poodles

Estava no seu calcanhar
Quando ela ía
Ao supermercado
Da sala para a cozinha
Ou da casa para a piscina

Porque quando
Ela me pegava no colo
Era carinho de quase mãe
E eu só faltava ronronar
Ou latir de alegria

Às vezes ela me jogava
Uma bolinha
(Talvez para me distrair
E eu sair do seu pé?)
Risos
Eram livros e mais livros
Biografias de mulheres fortes
Do tipo que ela admirava
E no qual provavelmente
Queria que eu me tornasse

Cultivou-me como
A uma plantinha
A filha que não teve
Extendeu o amor
Que tem à minha mãe
Para multiplicar-se
Em benfeitoria para mim

Me pagou o curso de inglês
Me ajudou num momento difícil
E salvou a vida da amiga de infância

E eu admiro tudo nela
A voz e o sotaque
O jeito de amar a família
A dedicação aos homens de sua vida
A relação com a mãe
A sobriedade com que analisa o mundo
A serenidade frente
Aos problemas mais difíceis

E sua opinião será sempre
Bem-vinda e ouvida
Sobre vaidade, profissão,
Amizade, amor, o que for

Faz corrente de oração
Por mim e meus filhos até hoje
E é um anjo em minha vida

Pouca gente tem madrinha
Que merece tanto o título
Quanto a minha:
Alma amorosa
Cuja capacidade de doação
Só pode ser dádiva divina
Te amo, Márcia Martins

Gota D'água

Ele não ligava
Prás pequenas
Trapaças
Bem sabia
Que o uísque
Do início da noite
Era um
E o do fim
Era outro
(Supunha-se que todos
Estavam bêbados
E não notariam)

Dava um desconto
Porque era rico
Porque a casa
Era de alegria
E as meninas
Bem treinadinhas
Fingiam que se
Envolviam

E ele tinha as
Suas favoritas
Que o conheciam
Pelo nome
E massageavam
O seu ego
E outras coisitas
Ooooopa!
Coisonas!
Mais...

Mas não teve jeito
A dama do lugar
Tão esperta
Com tanto tino
Comercial
Tanto bom gosto
Para convencer
Ex-misses
A trabalhar
Deu um belo de um tiro
No pé!

Ele nem se importava
Em dar de cara
Com uma ave
De vez em quando
Na saída de um quarto

Mas na hora
Que o maldito louro
Começou a chamá-lo
Pelo nome e sobrenome
Decidiu:
Definitivamente,
Era hora de trocar
De puteiro!

Promessa

No dia que eu
Sentar no seu colo
E cheirar o seu rosto
Bagunçar seu cabelo
E beijar sua boca

Cê vai se arrepender
De ter me conhecido

No dia que eu
Resolver está na hora
E falar "rumbora"
Sua mão na minha cintura
Minhas coxas suadas
Coladas nas suas

Cê vai perceber
Que não tem como fugir
Que não tem mais saída
Que não vai me esquecer
Tenta só procê vê...