terça-feira, 26 de setembro de 2017

Cláudio

Passamos bem uns três dias examinando a boca na frente do espelho. Nem um pequeninho, verdinho pra contar história. Nada na língua, nada nas bochechas. Eu esperava um criadouro de anfíbios em miniatura.
A classe toda já tinha se entediado de nos ver, sentados na escada, esperando os pais, ele no degrau de cima com os joelhos afastados e eu no de baixo, escutando e acreditando nas declarações de amor dele. Afinal de contas, eu era adorável mesmo, a tia Yara tinha dito.
Exigiram um selinho como prova do namoro, e achamos uma boa ideia. Não sentimos nada, óbvio, mas a reação estrondosa e a risada abafada quando a professora voltou pra classe eu não esqueço.
Numa manhã, resolvemos conversar: "E aí! Alguma coisa?" "Não. E vc?" "Também não."
Fiquei aliviada. "Demos sorte. Todo mundo sabe que criança não pode beijar porque dá sapinho na boca."
Eu tinha 5 anos. Ele, 7. Chorou de lágrima quando me mudei de Santos pra Limeira, por causa do emprego do meu pai.

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